quarta-feira, 1 de junho de 2011

A automutilação


Já faziam três meses que Hanna estava fazendo terapia, e as vezes saía do consultório da sua psicóloga sem saber absolutamente nada o que ela tinha dito.
Sentia que aquela não era sua vida, e odiava a pessoa que tinha se transformado. Bebia, fumava, e ia uma vez por semana ouvir o que aquela estranha tinha para dizer:
-Hanna vejo meninas lindas como você, se perderem todos os dias. É isso que você quer?
Hanna apenas levantava os olhos e milhares de palavras passavam pela sua cabeça: "não é isso que quero doutora! É por isso que venho aqui a três meses, para que a senhora me ajude a entender como é que essa merda toda começou? Foi depois que me mudei para cá? Eu acho que não! Acho que começou quando eu tinha três anos e uma prima enfiou o dedo na minha boceta, dizendo que eu ia gostar. Foi aí que tudo começou, e eu tô aqui sentada perdendo meu tempo, e gastando meu dinheiro."
A psicóloga pega os braços de Hanna, estavam cheios de marcas, uma atrás da outra. Ela pergunta:
-De quem você quer chamar a atenção?
- De ninguém.
-Então por que você faz isso?
Hanna olha para a psicóloga e pensa que ela deveria saber aquela resposta, mas se limita em dizer:
-Para aliviar a dor.
Era essa a única verdade. Hanna não queria chamar atenção de ninguém, mas as vezes sentia uma dor tão forte na alma e no coração, que se cortar e ver o sangue jorrando parecia aplacar momentaneamente aquele sentimento.
Volta para casa do mesmo jeito que saiu. Com o mesmo vazio, e com a sensação de que tudo que aconteceu era porque mereceu. Sentada no computador ela digita:
"Só aceito julgamento de alguém que tenha passado pelo mesmo que eu. Se alguém tiver sido molestado, enaganado, estuprado e agredido, aí eu me calo e aceito quieta sem dizer uma palavra sequer."
Hanna se levanta e vai para o banheiro. Puxa a manga da blusa, pega uma lâmina e faz outro corte no braço. O sangue desce, e ela sentia um prazer estranho: "dói pra caralho, mas não sei a razão, me sinto bem. De alguma forma devo ser forte, é preciso ter coragem pra fazer isto."
Ela assistia, sentada, o sangue escorrer de seu braço e juntamente com o sangue, as lágrimas desciam, mas não pela dor, era aquela tristeza infinita que não a deixava.

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